"Férias"

Férias!!! Que conceito é esse? O que serão realmente as férias?
Será apenas uma pausa no nosso quotidiano? Será descanso? Será quebrar a rotina? Ou simplesmente enterrar a cabeça na areia (de uma praia) e ficar a torrar ao sol sem pensar em nada??
Para fazer férias será necessário uma semana, 15 dias, um mês, ou mais?
Há quem julgue que fazer férias é apanhar um avião, fazer milhares de quilómetros para ficar numa praia, não tão diferente assim das que temos à porta de casa, a umas dezenas ou centenas de quilómetros.A areia pode ser mais branca, ter um coqueiro a mais e a água ser um pouco mais quente que a praia de nossa casa, mas será que é isso que faz a diferença? O que procuramos afinal?

A maioria, quando vai para um país estranho (o termo mais correcto seria diferente), faz geralmente aquilo a que eu chamo de “Férias de redoma de vidro”, em que teimam em levar o seu mundo consigo, escolhendo locais que lhes permitam um conforto à sua própria imagem. É como se levassem atrás, a sua casa ou um pedaço do seu país, uma pequena ilha de terreno familiar que os envolve e que os faça sentir seguros e que lhes permita olhar esse novo mundo estranho a uma distancia confortável, sem serem obrigados a ter uma grande interacção com o observado nem terem que entrar muito no mundo visitado.

Mas o irónico é que quando se volta dumas férias assim, apenas se esteve envolvido por tudo aquilo do qual nos queríamos inicialmente afastar e não se aprendeu nem se absorveu muito de novo, que passe a fazer parte de nós (para além de um escaldão ou outro, que passa quando acabamos de pelar os últimos vestígios dum bronze recém adquirido).

Mas afinal fazemos férias de quê? Do trabalho? Da nossa rotina? Da nossa família e dos que nos envolvem com os seus problemas? Ou dos que nos envolvem lembrando-nos os nosso próprios problemas? Férias é um pouco disso tudo, mas é também muito mais que isso!!! Quando embarcamos numa viagem dessas acabamos por gastar muita energia esforçando-nos por limpar a nossa cabeça dos nossos problemas, da nossa rotina, para nos sentirmos diferentes e mais leves, quando só teríamos que olhar para fora e à volta para conseguir isso.
Na realidade queremos limpara a nossa cabeça de nós próprios, fazer uma pausa. Mas isso é tão fácil se pensarmos nos outros. Foquem a vossa atenção nos outros, dêem-se ao trabalho e tenham a curiosidade de ver o quotidianos dos visitados, perceber as suas preocupações, os seus valores, a sua forma de olhar para a vida, as suas crênças e verão como o vosso espírito crescerá e aprenderá muito, sentindo-se em férias, sem ser necessário estarem a fazer o tal grande esforço para isso acontecer.

O choque de entrar noutra cultura, e perceber outras formas de encarar a vida é o melhor que se pode tirar duma viagem. Sentir o ambiente, as pessoas e o ritmo próprio do local (e não falo de música mas sim do ritmo de vida). Aí sim o nosso espírito vai fazer uma viagem e férias de nos próprios, crescendo com a experiência e vivência vivida e observada.

Férias para mim (e não tem que ser forçosamente para os outros) é viajar, conhecer outras realidades, outras culturas, outras formas de estar na vida, outras formas de olhar para a vida e até mesmo de compreender a vida.
Férias é não ter um objectivo específico e deixar o nosso espírito beber e aprender tudo o que nos rodeia. É não ter planos nem obrigações e simplesmente deixar a viagem ir acontecendo. E o mais engraçado é que nessa situação até mesmo as surpresas que na altura nos parecem desagradáveis se tornam uma lição que nos ajuda a conhecermo-nos melhor.

O meu ideal de férias é comprar um bilhete de avião, para um outro local, uma outra cultura, e para completar a ementa... para um outro clima. Pode ser um clima mais quente ou mais frio, desde que seja diferente. Experimentem não ter sequer um hotel marcado e deixarem a viagem simplesmente acontecer. Não se preocupem com o destino e aproveitem o caminho, as paisagens que vão vendo, aquilo que nos vai acontecendo e as pessoas que vão encontrando. Tudo vos envolverá com uma razão de ser própria e oportuna, só é preciso ter o espírito aberto para poder tirar o verdadeiro partido disso. Tomem tempo para conhecer as pessoas no vosso caminho e verão que em todo o lado há sempre alguém (ou muitos “alguéns”) que vale a pena conhecer. Alguém que vai partilhar connosco a sua forma de olhar a vida, e que sem nos apercebermos vai-nos deixar muito mais ricos. Esse conhecimento não é emprestado, é oferecido e acompanhar-nos-à o resto das nossas vidas.

Apanhar os transportes locais em vez do transporte exclusivo que nos leva do aeroporto ao pomposo “resort”, mantendo-nos protegidos da quarentena ameaçadora da população local, pode ser um mundo de experiências, uma das melhores formas de perceber a realidade dessa população.
Aceitar a hospitalidade e simpatia que aí nos é oferecida pode ser das maiores surpresas e das melhores experiências.
Deixar de ter medo da “suposta ameaça” que representam essas populações estranhas pode resultar numa agradável surpresa, numa cura para muitos males que nós próprios padecemos sem nos apercebermos.
Aceitar um convite para tomar uma água, num alpendre dum velhote simples e analfabeto, que nos viu passar e achou que precisávamos de um momento de descanso para recompor as forças, pode ser o início de uma viagem de conversa, de sabedoria de vida, de uma rectidão e generosidade surpreendentes, descobrindo uma pessoa como raramente se encontra hoje em dia.
Aceitar a hospitalidade duma família simples, ficando a conhecer que ainda há pessoas que sem nos conhecerem de lado nenhum, nos recebem de braços abertos, com uma sinceridade genuina e um prazer em receber e agradar, tratando-nos como filhos adoptivos, dando e partilhando tudo o que têm e que até lhes pode fazer falta, de tal forma que até ficamos comovidos e ao mesmo tempo envergonhados, quando pensamos se teríamos feito o mesmo por eles se tivessem vindo ao nososo país, sem pensarmos que se estavam a querer aproveitar de nós.

Se nos permitirmos isso, e formos com esse espírito serão colocadas as pessoas certas no nosso caminho, que farão da nossa viagem uma vivência única.
É esse tipo de vivência, de nos permitirmos conhecer as pessoas dos locais que visitamos, de parar para conversar, e para ouvir o que têm para nos dizer, e de não ter pressa nem objectivos, que nos vai permitir trazer para casa uma riqueza permanente que não vai desaparecer com o tal bronze que trouxemos emprestado.

Agora tudo isto que aqui referi, pode ser, sem qualquer dificuldade, aplicado à nossa vida, e não só à nossas férias...
Para a maioria de nós, cada dia é apenas um "ilustre degrau desconhecido" numa escadaria, em que os nossos olhos fitam apenas o cume, o fim do caminho, o dito futuro, ignorando as riquezas de vida e de alma que se encontram em cada degrau, ou em cada dia.
Um amigo meu leu uma vez escrito na parede de uma casa de banho, escrito por um “back-packer”, “Life is a jorney, not a destination!!!”
Não devemos condicionar cada dia com base numa falsa promessa de futuro. O Futuro é apenas o presente do amanhã. E o Presente é apenas o Futuro de ontem.
Só temos é que aproveitar e viver o presente. Em toda a nossa vida nunca iremos viver o futuro!! Iremos sempre, mas sempre, viver o presente. O futuro só será vivido no momento em que se torna presente...

É preciso estarmos mais abertos para o que nos envolve, focando a nossa atenção no dia a dia, focando menos a nossa atenção nos nossos objectivos de futuro e desviá-la para o simples presente ao nosso lado.

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