"Viva la Vida"


Hoje tive um dia fantástico! E na realidade nada de inesperado, grandioso ou surpreendente aconteceu.
Aconteceu apenas que me lembrei de olhar para a minha vida de uma forma menos habitual.
Aconteceu apenas que me lembrei de dar o devido valor às pequenas coisas de um dia normal.
Não aconteceu nada que não tivesse acontecido em dias anteriores.
Olhei para o nascer do Sol por entre as nuvens, resultando dessa imagem um quadro memorável que se tivesse tido a oportunidade de ter sido pintado por um dos grandes Mestres, seria certamente imortalizado! E eu tive esses espectáculo diante dos meus olhos. O Sol deu-se ao trabalho de dar-nos aquele espectáculo, e naquele momento lembrei-me dos outros tantos dias que pela pressa e preocupação nem me dei ao trabalho de olhar para ver se ele estava lá.
Olhei à volta, e tal como eu nos dias anteriores, todos passavam na sua azáfama, sem se apreceberem da maravilha que estavam a perder.
Lembrei-me de imediato do cego que vi ontem no metro, e pensei que a ele lhe foi negado esse privilégio. E como ele outros tantos no mundo inteiro não podem disfrutar da simples maravilha de um pôr do Sol, ou da maravilha que pode ser o poder olhar para o mar e ver os fantásticos tons de azul e verde com que nos deleita.
E fui até à praia, descalcei-me, e andei descalço pela praia a ter o prazer de sentir a areia húmida em cada passada que dava, ouvir o rebentar das ondas próximo de mim, sentir os salpicos da rebentação na minha cara, poder parar para apreciar o momento e continuar a andar. E apercebi-me do outro privilégio que é poder fazer isso, de ter a liberdade e a capacidade para o fazer. Quantas pessoas não o podem fazer, porque estão paralisadas por algum infortuno acidente, porque assim nasceram ou porque a idade já não lhos permite…
Estamos cheios de privilégios na nossa vida, no nosso dia a dia, e teimamos em pensar apenas naquilo que não temos, ou naquilo que temos ainda que alcançar, ou simplesmente esquecemos que temos um mundo à nossa volta para sentir.
Não pensamos no privilégio que é ter um pai e ter uma mãe que nos amaram incondicionalmente e sacrificaram-se por nós, quando muitos outros não conheceram sequer pai e mãe.
O privilégio que é ter irmãos e irmãs que por mais que aconteça, por mais zangas que existam, estarão sempre lá quando todos os outros já não estão.
O privilégio que é ter amigos que quando é preciso estão lá para nos apoiar. E o privilégio maior que é podermos nós estar lá a apoiar quando um nosso amigo precisa de nós.
O privilégio de ter uma pessoa ao nosso lado que apesar dos nossos defeitos, nos aceita como é, por saber valorizar também as nossas qualidades, .
O privilégio que deve ser ter um filho e saber que podemos ajudar na formação daquele pequeno ser e dar-lhe, quem sabe, se tivermos sabedoria para tal, as "ferramentas" certas que um dia poderão ajudá-lo, talvez a mudar este mundo para melhor. A verdade é que alguém já foi pai de um Ghandi, de uma Madre Teresa, um Mandela ou de tantas outras almas cujo exemplo deixou a sua marca na melhoria da humanidade.
O privilégio quase divino de poder rir de simples felicidade, de poder partilhar uma Sonora e genuina gargalhada com alguém.
Quantas pessoas já perderam a capacidade de rir, e quantas não têm ninguém para partilhar uma gargalhada?
É verdade que se tivessemos muito dinheiro, teriamos algumas facilidades a mais do que aquelas que temos, mas a verdade é que a capacidade de ser feliz não tem nada a haver com isso. Essa depende e dependerá sempre e apenas de nós.

Este verão fui aos Açores, e ao fazer uma caminhada pela encosta poente da ilha das Flores, num cenário idílico em que cruzávamos cascatas que se precipitavam directamente no mar, gozei de um momento privilegiado: a certa altura um vulgar pássaro, um melro, pousou numa arbusto ao pé de mim e começou a cantar. E ao vê-lo sentei-me numa pedra que delineava o percurso e silenciei. Foi um canto fantástico e lindo, que eu desconhecia possível nos melros e que continuou por um tempo imenso. A probabilidade de tal acontecer era pequena, e a probabilidade de eu estar atento para a disfrutar menor ainda, mas por alguma razão aconteceu e tive um prazer tão grande ou maior como se estivesse confortavelmente sentado no melhor "Concert Hall" a ouvir a melhor orquestra filarmónica… e na verdade estava apenas sentado numa pedra, debaixo duma árvore, a ver e a ouvir um simples e vulgar melro cantar.
A nossa capacidade de ser feliz passa, em grande parte, de nos lembrarmos dos privilégios que temos e saber tirar partido deles. E se pudermos lembrar aqueles que nos rodeiam disso tanto melhor.
A infelicidade ou felicidade pode depender apenas do ponto de vista com que escolhemos olhar para a vida e para tudo o que nos rodeia.

"Viva la Vida"

Comments

Inês said…
Meu Querido! Há largos anos que defendo que ser feliz é uma ATITUDE! Só depende de nós sermos ou não felizes. beijos da prima
HELENA AFONSO said…
OLÁ FM. Hoje, depois de passar um dia muito feliz em casa de seu Pai, vim ver o seu blog. Fiquei fascinada pelas maravilhosas fotos qu ele me mostrou. A sua arte fotográfica revelam um talento e uma sensibilidade excepcionais. Mas agora mais fascinada fiquei com a sua maravilhosa maneira de expor os seus sentimentos e demonstrar uma atitude tão genuina de ver o mundo!PARABENS FM.
Este seu texo sobre a VIDA devia ser lido por toda a gente, novos, velhos, iletrados, doutores, crentes, ateus ou meramente indiferentes......ADOREI, o seu estilo de escrever, a humanidade que transpira nas entrelinhas, o amor pelas coisas mais simples da natureza.... a sua profunda franqueza.
Virei aqui muitas mais vezes deliciar-me com estes textos,
Dê um espreitadela no meu blog, beijinho, HELENA

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